Marlyana Tavares – Vice-campeã da Copa do Mundo de futebol de 2018, a Croácia bate um bolão junto aos turistas. Cidade mais visitada do país, Dubrovnik é encantadora pelo contraste das construções de pedra, telhados vermelhos e os azuis berrantes do Mar Adriático. Não pude ficar mais do que um dia em Dubrovnik, pois estava a bordo de um cruzeiro, como centenas de turistas que ali chegam. Por isso, flanei pela Stradun, rua principal, e pela Muralha extremamente bem conservada.

Com 298m de comprimento, a Stradun leva a igrejas góticas, renascentistas e barrocas, sinagoga, torres e monastérios e, já que ninguém é de ferro, bares, restaurantes, delikatessens e lojinhas. Com seu piso de mármore quase branco, deságua na Praça Lusa, onde está a Torre do Relógio e a Igreja de São Brás, padroeiro da cidade.

Dubrovnik é tão bela quanto presa de um passado marcado por duas grandes tragédias: a guerra da Iugoslávia que a deixou sob uma chuva de 2 mil bombas, e um terremoto que a destruiu. A raça com que o time de futebol chegou ao final do campeonato de futebol tem tudo a ver com o povo croata, dono de uma forte resiliência.

*Foto: Vista de Dubrovnik (Deposit Photos)

Roteiro para um dia em Dubrovnik: a Stradun

Praça Lusa, com a Torre do Relógio e mesinhas na calçada (Marlyana Tavares)

A cidade de Dubrovnik tem a parte mais antiga, também mais visitada e a parte das praias, onde não deu pra ir.  Eu tinha pouco tempo e o dia estava meio nublado. Para ir ao Centro Histórico, declarado Patrimônio da Humanidade pela Unesco, em 1979, há duas entradas principais, mas a melhor é Pile, que leva à Placa ou Stradun, a rua de mármore para pedestres onde estão as mais importantes edificações.

Logo no início da caminhada pela Cidade Antiga, na Stradun, fica a Fonte de Onófrio, um grande chafariz poligonal, com mascarões esculpidos. Desenhada pelo napolitano Onofrio della Cava, a fonte servia para abastecer a população, no século 15. Dela saía água puxada de 12 km dali. Essa fonte tinha várias esculturas, mas o terremoto danificou-a bastante, restando estes 16 mascarões que jorram água, mas para um poço interno. Hoje ela não serve de abastecimento, mas sim a ponto de encontro de moradores e turistas.

Construção em pedra, com mascarões de onde sai água para um poço que a circunda

Mascarões da Fonte de Onófrio (Marlyana Tavares)

À esquerda da fonte, o Monastério Franciscano abre-se aos visitantes (entrada é paga). Se a antiga igreja do mosteiro foi destruída pelo terremoto, resta intacto um portal gótico com uma escultura da Pietá. No interior do atual templo barroco estão os restos mortais do maior poeta local, Ivan Gundulić. Agradável caminhar pelos corredores do pátio com jardim, circundado por colunas em arcos, bem altas.

Visitei uma farmácia com aqueles vidros bem antigos, que ainda está em funcionamento. Você pode entrar em comprar produtos normalmente. Esta farmácia é considerada uma das mais antigas da Europa. Lá dentro há peças dos séculos 17 e 18. Infelizmente a foto que tirei é impublicável.

Outra curiosidade do mosteiro é uma biblioteca com 20 mil volumes, considerada uma das mais antigas da Croácia. Há também um museu, mas preferi não entrar, porque queria conhecer mais coisas do lado de fora.

Mosteiro Franciscano: no alto das colunas foram esculpidas caras, bichos e flores (Marlyana Tavares)

A Stradun segue em direção à Praça Luša onde se encontram bares com mesinhas na calçada e a torre do relógio.  Na praça fica o Palácio Sponza, antiga Casa da Moeda de Ragusa, como Dubrovnik era chamada na era medieval.

Pelas escadarias da igreja barroca de St. Blaise (São Brás), patrono da cidade desde 972, espalham-se pessoas vindas de todos os cantos para assistir a eventos artísticos. Consta na história local o fato de que São Brás teria sido responsável por avisar sobre as más intenções de venezianos ancorados no porto.

Os estrangeiros foram rechaçados e São Brás glorificado pela população, que comemora o seu dia em 3 de fevereiro. A imagem do santo é impressa em bandeiras, moedas e pinturas.

Chapéu e mão de metal e pedras preciosas

Relíquias de São Brás (Marlyana Tavares)

Vale a visita à Catedral da Assunção da Virgem, onde a estão as relíquias de São Brás, além de outras 138 feitas em prata entre os séculos 11 e 17, que são transportados durante a procissão em homenagem ao santo. Sobre o altar ficam as relíquias mais importantes –as que contêm o crânio de São Brás, conservado em uma coroa bizantina de ouro.

Ruas laterais

Não me detive somente na Stradun, mas saí andando meio a esmo pelas ruas laterais, atraída pelos varais e mesinhas de fora das casas.  Sempre quando a gente se distancia dos pontos mais turísticos pode descobrir coisas mais originais.

No caso de Dubrovnik, becos com varais, decorações inusitadas na frente das casas de moradores comuns, terrenos com restos de construções atingidas por bombas. Cenas mais distantes de lentes óbvias.

Mulher com toalhas bordados nas mãos

Moradora oferece bordados (Marlyana Tavares)

Em rua paralela, mesinhas à espera do freguês, lanternas e varais em Dubrovnik

Em rua paralela, mesinhas à espera do freguês, lanternas e varais (Marlyana Tavares)

Fachada de uma casa, com flores

Decoração inusitada na fachada de uma casa (Marlyana Tavares)

A Muralha

Pátio na muralha, com antigo canhão (Foto: Marlyana Tavares)

De um lado o oceano, de outro o mar de telhados em terracota do casario intramuros de Dubrovnik. Por isso, é bom percorrer com calma a muralha de dois quilômetros, parando de quando em quando para descansar, contemplar, registrar em fotos cenários de rochas e pedras, fortes e ondas. 

Em certos locais, os paredões alcançam 25 metros de altura. Em outros, onde eram colocados canhões ou janelas de observação, abrem-se pátios com vistas estupendas do mar, onde a gente fica descansando e tirando belas fotos. A entrada para a muralha é paga e você pode alugar audioguias.  

Pessoas andando por uma muralha e telhado de várias casas em Dubrovnik

Passeio pela muralha dura 1 hora e é bastante concorrido

Ao longo dos corredores de pedra com até 6 metros de espessura encontram-se 15 fortes, erguidos entre os séculos 13 e 16. Um dos fortes mais famosos é o Lovrjenac, que foi construído para evitar invasão por mar e terra da parte oeste da cidade.  Ele é o mais isolado e fica sobre um rochedo. Hoje ele é palco de eventos artísticos, como peças do teatro clássico.

Dubrovnik recebe muitos navios de cruzeiro, então, não será incomum que você tenha que dividir os espaços com muita gente. Ficando mais de um dia, talvez dê para fugir disso.

A entrada e a bilheteria para percorrer a muralha ficam ao lado do Portão de Pile, mas é possível entrar pelo portão de Ploce, se o primeiro estiver muito concorrido. A caminhada só é permitida em um sentido, o que é ótimo para evitar inevitável tromba-tromba.

Rochedo e o mar

Forte Lovrjenac (Foto: Marlyana Tavares)

A volta por cima

Construções devastadas pela guerra vistas em um dia em Dubrovnik

Ruínas encontradas em área mais distante de locais turísticas (Marlyana Tavares)

Dubrovnik foi fortemente atingida pelo bombardeio na guerra com a Sérvia. Um vídeo que comprei numa loja, para conferir depois toda esta história, mostra o grau da destruição. Foi aí que eu percebi o peso do que tinha acontecido naquele local tão belo quanto sofrido.

A guerra com a Sérvia deixou Dubrovnik sob o jugo de 2 mil bombas, a maioria atirada de embarcações no porto e outras por aviões. Deste ataque, feito no dia 6 de dezembro de 1991, restam buracos de bala em paredes de pedra na Stradun. Eu também vi uma construção em completa ruína (foto acima).

O vídeo mostra cenas muito tristes: muitas perdas materiais e humanas. De cada 3 prédios, 2 foram atingidos. Mas o grande fato é que a cidade foi toda refeita em tempo muito rápido, e o Centro Antigo declarado Patrimônio da Humanidade.

O documentário mostra que enquanto sirenes soavam, angustiantes, anunciando o ataque, pessoas procuravam abrigo. As ruas vão se esvaziam em um dia ensolarado.  As paredes acinzentadas das casas e os telhados avermelhados contrastam com o azul profundo do céu. Bombas caem de aviões rasantes. Ouvem-se tiros de metralhadora. Moradores se amontoam em abrigos claustrofóbicos.

Torres de comunicação são bombardeadas por barcos. Grupos de pessoas que ainda se encolhem sob marquises e telhados comentam a aproximação do inimigo. Estão confusas, amedrontadas. Os navios e barcos ancorados no porto estão em chamas. Os feridos começam a chegar aos hospitais. Mulheres, homens e crianças, choram.

O relógio da City-Bell Tower é frágil diante das bombas errantes. As pessoas andam sobre destroços e, no belo Monastério Franciscano um padre se encolhe com medo da bomba que caiu ali perto. Mais tiros atingem a fortaleza de pedra. Mulheres vestidas de preto rezam sobre um corpo.

Na Stradun em ruínas, donos de lojas começam a tirar os móveis e objetos do interior das casas. Põem na calçada, ainda aturdidos, tudo o que sobrou intacto. Sacodem a cabeça, calculam prejuízos, olham desolados para a catedral, que tem vários pontos destruídos. Há entulho por toda parte. Os atingidos lamentam as perdas. A Fonte de Onófrio, orgulho da comunidade, foi abalada. Tudo é caos. 

Recuperação

Pessoas andam por uma rua em um dia em Dubrovnik

Turistas andam pela Stradun, onde fica que conduz à maior parte dos prédios históricos e igrejas (Marlyana Tavares)

Quem se interessa por viagens e história como eu, deve visitar a galeria fotográfica War Photo Limited. O andar superior é todo dedicado ao tema da guerra local, em exposição permanente, com fotos de Ron Haviv, e outros recursos audiovisuais. No andar de baixo as exposições são temporárias, mas sempre sobre o tema. A entrada é paga.

A recuperação do que a guerra destruiu ficou em R$ 10 milhões e hoje o turismo é a principal atividade, injetando outros tantos milhões a cada ano na economia local.

Serviço

Bondinho, cidade amuralhada e o mar

Bondinho liga o Monte Srd à cidade (Deposit Photos)

Como chegar a Dubrovnik

*Muitas pessoas, como eu, chegam a Dubrovnik a bordo de navios de cruzeiros. Os navios param no Porto de Gruž, onde os passageiros dos navios pegam os ônibus até próximo ao Portão de Pile. Esse ponto de parada também acolhe os ônibus vindos de Lapad, bairro situado a 4km da cidade amuralhada, onde ficam vários hotéis.

*Cerca de 21 companhias aéreas operam no Aeroporto Internacional de Dubrovnik. A British Airways (saindo de Gatwick, em Londres) e a Easy Jet (partida de Londres Stansted) tem voos regulares, o ano inteiro. Há três voos diários ida ou volta de Zagreb pela Croatia Airlines. A companhia faz voos sem escalas para Frankfurt e voos não frequentes para Roma, Paris e Amsterdam. Outras cias saindo de Londres sao Jet2, Palmair, Wizz Air, Thompson Airways, flyBe, Bmibaby.

*De ônibus, se você estiver chegando à Croácia por Split, o trajeto rodoviário até Dubrovnik dura 4h30min. Já de Zagreb, o trajeto de ônibus dura 11h. 

Onde ficar

*Para ser mais econômico a opção é ficar em casas particulares. Elas são credenciadas e devem ter a placa azul escrito Sobe, que quer dizer quartos disponíveis . É comum, nos terminais e ônibus e ferryboat, ficarem várias pessoas oferecendo acomodações, mas é melhor dar uma olhada antes nas agências turísticas ou escritório de turismo da cidade.

*Há duas localizações de hospedagem em Dubrovnik, que tem de aluguel de casas e hostels a hotéis mais chiques. Na Cidade Velha e arredores e em Lapad. Caso opte por Lapad, onde a oferta é maior, há boa oferta de ônibus. Um casal que esteve por 4 dias em Dubrovnik me contou ter ficado hospedado nos arredores da Cidade Velha, próximo ao Monte Srd. O bondinho facilita bem a vida de quem se hospeda nessa região, mas o percurso é pago.

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